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Adolescência


A minissérie, que estreou na semana passada no streaming, foi produzida por Stephen Graham, que também interpreta o protagonista, e Jack Thorne. Seu enredo narra a história de uma família que vê sua vida ser drasticamente alterada após a prisão de um dos seus membros, Jamie Miller (interpretado por Owen Cooper), um adolescente de 13 anos, acusado de homicídio de uma colega de escola.


A trama é envolvente e aborda diferentes perspectivas: o crime em si, o ambiente escolar permeado pelas redes sociais e pelo bullying, as dinâmicas familiares, e, é claro, as complexidades psicológicas que o protagonista, na pele de Jamie, nos apresenta. É sobre esse último ponto que gostaria de refletir, pois ele remete ao processo de formação do "eu". Nesse contexto, adotaremos o conceito do "eu" como a consciência, aquela que dá contornos ao entendimento de o que é ser uma pessoa.


No texto O estádio do espelho, o psicanalista Jacques Lacan sugere que o "eu" passa por uma fragmentação e, diante de uma imagem, tem a oportunidade de constituir uma unidade. Em seus seminários subsequentes, especialmente nos seminários 1 e 2, ele explora a importância dos registros imaginário e simbólico na formação do "eu", propondo que esse processo ocorre por meio de uma dialética. O "eu", representante da consciência, precisa do "outro" para se unificar e atribuir sentido à sua existência, mas, ao mesmo tempo, busca sua autonomia, sem depender exclusivamente desse jogo imagético para sua constituição. Ou seja, a ideia de um "eu" puramente autônomo e independente das relações sociais não se sustenta.


Dito isso, voltamos à minissérie, cujo protagonista, Jamie, é um adolescente ávido pela validação e pelo olhar de seu pai — uma validação que é, muitas vezes, tímida ou até mesmo ausente. Restando-lhe apenas o apoio de seus amigos no ambiente escolar, onde as relações são regidas por códigos e rótulos amplificados nas redes sociais. Se a adolescência já é, por si só, um período delicado, no qual os jovens buscam referências para a construção de sua identidade, esse processo se torna ainda mais árduo em um ambiente onde a norma predominante é a desconstrução do outro.


É nesse contexto que Jamie se vê invalidado no seu ideal de masculinidade. Trancado no quarto, entregue aos jogos de computador e às redes sociais, busca reconquistar esse ideal, o qual não teve sucesso, somado à falta de apoio e escuta no ambiente ao seu redor, a tragédia acontece.

Nesse momento, somos levados a refletir sobre a importância da interação entre o "eu" e o "outro". Na mediação entre essas duas instâncias, deve surgir um espaço subjetivo onde o sujeito possa se constituir, por meio do interesse, da escuta e da consideração. É visível que estamos vivendo um momento de carência desses aspectos.


Assistir à minissérie me leva a pensar sobre como estamos acolhendo nossos jovens. Que condições de escuta estamos oferecendo a eles? Quais instrumentos a coletividade está disponibilizando para ouvi-los e considerá-los? Não se trata de uma questão singular, mas sim plural. Um sistema educacional preparado para escutar o sujeito pode fazer toda a diferença. Figuras maternas, paternas e de cuidadores com condições internas para acolher o adolescente podem transformar o rumo de uma vida.

 

 

 
 
 

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